Conselho Federal de Medicina torna mais difícil o “descarte” de embriões
O Conselho Federal de Medicina (CFM) alterou as normas para a reprodução assistida e reduziu o número de embriões que podem ser gerados em cada procedimento. As novas regras foram publicadas no Diário Oficial da União na última terça-feira (15) e substituem as normas que estavam em vigor desde 2017.
A resolução 2.294/21 estabelece que, a partir de agora, os médicos poderão gerar no máximo oito embriões em cada procedimento de fertilização in vitro. Antes, não havia um número máximo definido pelo CFM.
No processo de reprodução assistida, é comum que o médico tente fertilizar um número elevado de óvulos, de forma a obter uma grande variedade de embriões e, assim, selecionar aqueles que aparentam ter mais chances de se desenvolver depois de implantados no útero. O procedimento, entretanto, acaba gerando um excesso de embriões que nunca serão utilizados.
Pela nova resolução do CFM, o número máximo de embriões a serem implementados em um mesmo procedimento depende da idade da paciente. Mulheres abaixo dos 37 anos de idade podem receber dois embriões. A partir daí, o limite é de três. Os demais devem ser “criopreservados” – ou seja, mantidos congelados a baixas temperaturas. Em tese, esses embriões podem ser reaproveitados no futuro e implementados no útero da paciente. Mas, quase sempre, eles permanecem congelados até que o “descarte” possa ser feito.
Pela regra anterior, o “descarte” poderia ocorrer depois que o embrião excedente passasse pelo menos três anos congelado. “Os embriões criopreservados com três anos ou mais poderão ser descartados se esta for a vontade expressa dos pacientes”, dizia a norma do CFM. Agora, o período de três anos foi mantido, mas aparece acompanhado da expressão “mediante autorização judicial”.
A nova regra mantém a possibilidade da “cessão temporária de útero”, a chamada barriga de aluguel, mas apenas quando houver um parentesco consanguíneo de até quarto grau – e sem “caráter lucrativo ou comercial”.
Pequeno avanço na proteção de embriões
Para Lenise Garcia, professora aposentada de Biologia da Universidade de Brasília e integrante do Conselho Nacional de Saúde, a resolução é um passo na direção correta. Ela diz, entretanto, que a proteção aos embriões deveria ser regulamentada por lei.
“Acho que houve um pequeno avanço, embora ainda fique muito a desejar. A reflexão provocada no casal pelo fato de eles já terem de definir, antes da criopreservação, o destino dos embriões, pode ser um fator que na prática tenha efeito. Ao ter que refletir eles podem optar por não ter embriões supranumerários”, diz ela. Embriões supranumerários são os excedentes gerados durante o processo de fertilização.
Para Lenise, o descarte de embriões é uma consequência da preservação por meio da criogenia. “O principal ponto é dificultar a criopreservação. Saber que vai ser preciso uma ação judicial para descartar, além da limitação de oito embriões, pode ter um efeito positivo”, afirma.
Ainda segundo Lenise, um dos problemas no campo da reprodução assistida é a ausência de uma legislação que trate do assunto – segundo ela, por omissão do Legislativo. “É preciso que houvesse uma legislação e que essa legislação proibisse o congelamento. Uma vez permitido o congelamento, o descarte é quase inevitável, porque eu nunca vou conseguir implantar todos aqueles embriões que foram criopreservados”, explica.
Números
Segundo a Anvisa, o Brasil tem 183 centros de reprodução assistida. Em 2019, foram realizados cerca de 44 mil procedimentos de fertilização in vitro, o que representa um aumento de mais de 100% desde 2012. No período, para cada embrião implementado no útero, quatro foram descartados. Ainda segundo a agência, aproximadamente 100 mil embriões foram congelados no país somente em 2019. Isso é mais do que o dobro do registrado em 2014, e três vezes o total de 2012.